Qwerty Editorial – Que lições tiramos do 20 de setembro?
Tradicionalismo e vida moderna. Como conciliar essas duas realidades da gente do Sul. Reflita conosco e deixe sua opinião.

O desfile tradicionalista de 20 de setembro é, sem dúvida, um dos eventos mais importantes, não só de Dom Pedrito, mas de todo o Rio Grande do Sul, e mais, onde quer que haja um gaúcho, lá estará ele, de alguma forma, voltando o pensamento para as coisas de sua terra. Aliás, a própria ciência explica esse fato, existe uma ligação íntima entre o ser e o lugar onde ele nasceu, são como que raízes fluídicas que o fazem de quando em quando, relembrar, reviver experiências anteriores.
Na Capital da Paz, ano após ano, tradicionalistas de todas as idades se preparam por um largo período para o dia do tão esperado. Desfilar a cavalo pela Rua Borges de Medeiros representa para essas centenas de prendas e peões um balaio de sentimentos, onde entram diversos ingredientes, que misturados, representam o orgulho de ser gaúcho.
No dia derradeiro, são algumas horas de preparação e alguns minutos sob o lombo dos cavalos ou a bordo das charretes e carroças, ante o aplauso do público que, encantado, sente o coração bater mais forte.
Mas existe aparentemente, uma rachadura na sociedade local que está tornando esse dia de festa, em um motivo de contendas, como tem sido nos últimos anos. Após o desfile propriamente dito, muitos cavalarianos continuam no centro da cidade. Eles se aglomeram a volta de bares, postos de combustíveis ou qualquer outro lugar onde haja venda de bebidas alcoólicas; percorrem as ruas disputando o espaço cada vez menor com os condutores de automóveis que, impacientes, buzinam, xingam, exclamam nas redes sociais a sua insatisfação com aqueles a quem aplaudiam momentos antes.
No dia 20 de setembro, o que se viu foi uma disputa por espaço. Motoristas dizem que os cavalarianos atrapalham o trânsito; por sua vez, estes dizem que também tem o direito de estar com seus cavalos nesse dia. Alheia a isso, a Brigada Militar estipulou o horário das 19h daquele dia para que os cavalarianos se dispersassem, o que não foi respeitado, é bom que se diga. Diante disso, os policiais iniciaram como que uma operação para que a gauchada abandonasse o centro da cidade. Alguns mais exaltados, reclamavam da medida e teve até quem decidiu partir para a agressão, o que obviamente não acabou bem.
O fato é que direitos todos possuem, porém, vale aquela máxima que diz: o direito de um vai até onde começa o do outro, é bem simples. Além do mais, foi notório que a aglomeração de muitas pessoas, independente de elas estarem a cavalo ou não, resultou em um comportamento singular quando o indivíduo se encontra em uma massa comum – a crença de ficar oculto e da impunidade. Não deverá ser outro o motivo para que fossem registrados alguns acontecimentos pontuais, além da sujeira deixada.
A despeito de direitos de uns e outros, o fato é que as cenas vistas no centro da cidade, logo após o desfile tradicionalista são incompatíveis com a vida moderna. O trânsito em Dom Pedrito, em um dia de feriado à noite, não comporta sequer os veículos que se aglomeram nas ruas centrais. Como querer que no mesmo espaço, estejam centenas de cavalarianos ? é uma questão de lógica. Houve até quem tivesse o disparate de dizer que eram os veículos que atrapalhavam os animais. Seria o mesmo que dizer que os animais a campo estão atrapalhando o trânsito de veículos. Outra questão a ser analisada, diz respeito ao bem estar animal. Cavalos que passaram o dia inteiro sem beber água, sem ser alimentados, estavam sendo expostos a condições extremas.
Por isso dizemos sim ao tradicionalismo, à cultura e à preservação da história; mas somos obrigados a dizer não ao abuso, à baderna e ao desmando de alguns homens a cavalo que não representam o movimento gaúcho.